quarta-feira, 13 de julho de 2022

Então eu os chamo de Imperdoáveis

     Ele nos traz todo tipo de sentimentos: alegria, tristeza, saudade, arrependimento entre tantos outros e a verdade é que, indubitavelmente, o passado ajuda a definir quem nós somos. Podemos ignorá-lo ou também recorrer a ele somente quando é conveniente mas também podemos sucumbir às suas moléstias e ficarmos presos em nossos atos de outrora em detrimento de nosso presente e de nosso futuro e este é o tema central do filme “Os Imperdoáveis” (Unforgiven, 1992) dirigido e protagonizado por Clint Eastwood.


    A obra tem início no ano de 1878 onde vemos a sombra de um homem cavando uma sepultura, o letreiro que acompanha a cena nos faz entender que se trata do pistoleiro aposentado Will Munny (Eastwood) enterrando sua esposa Claudia e que este casamento gerou grande angústia na  mãe da falecida devido ao histórico de violência do genro. Dois anos depois, na cidade de Big Whiskey, a prostituta Delilah (Anna Thomson) é atacada e tem seu rosto retalhado.  O dono do estabelecimento Skinny (Anthony James) e o xerife Little Bill (Gene Hackman) chegam a um acordo com os agressores que consiste somente no pagamento de uma multa. Inconformada com a impunidade e compadecida pelo sofrimento da colega, Alice (Frances Fisher) se reúne com todas as garotas do prostíbulo para juntar a quantia de mil dólares e oferecer o dinheiro como recompensa para quem matar os homens que participaram da ação contra Delilah.

                A notícia da recompensa se espalha e Schofield Kid (Jaimz Woolvett), sobrinho de um antigo colaborador de Munny, recruta o veterano e também Ned Logan (Morgan Freeman), antigo comparsa e amigo de Will, para a empreitada. Relutante e sem estar física ou emocionalmente preparado para mais uma matança o protagonista aceita devido a suas dificuldades financeiras agora que se tornou um fazendeiro e pai viúvo de duas crianças. O que os caçadores de recompensa não sabem é que, no intuito de proteger sua cidade, o xerife Little Bill irá tratar com extrema violência os forasteiros que buscam os mil dólares.





                A direção de Eastwood é impecável e todos os elementos cinematográficos desse filme demonstram esmero e dedicação: desde as atuações, passando pela bela fotografia que ressalta os elementos sombrios dos personagens e nos mostra belas paisagens e também a música que transmite toda a melancolia que permeia a obra. Mas, sem dúvida, o destaque vai para o roteiro de David Webb Peoples que faz do filme mais do que uma simples história de caça e vingança já que em sua essência “Os Imperdoáveis” é um estudo sobre o passado não apenas de um homem mas também de um gênero cinematográfico do qual Eastwood foi um expoente nas décadas de 60 e 70.  Já velho Will enfrenta dificuldades para subir em seu cavalo, não se gaba dos assassinatos que cometeu (nem ao menos gosta de tocar no assunto) e adoecido depois de tomar chuva fica vulnerável e a mercê da truculência de Little Bill. O que também desperta interesse pelo personagem é sua grande devoção a sua falecida esposa pois, quando rejeita a compania de outras mulheres ele fala como se Claudia ainda fosse viva e sempre que pode enaltece o papel fundamental dela em sua mudança de vida.

Não apenas a velhice da figura do cowboy é retratada mas também a maneira como as histórias se disseminavam naquele contexto: homens que se vangloriavam de coisas que não tinham feito ou que haviam feito por sorte e não competência e até mesmo a omissão de fatos  para evitar repercussão indesejada. Outros dois elementos utilizados pelo roteiro para enriquecer não apenas a jornada de Will mas também a narrativa são o merecimento e a chuva. A caminho de Big Whiskey Will lembra Ned de um homem que matou no passado e questiona o amigo se aquele cowboy merecia ter morrido. Já no ato final do filme e sedento por vingança o velho pistoleiro ouve de um homem prestes a morrer que ele não merece aquele destino e ouve como resposta de Will que “Merecer não tem nada a ver com isso”. Passado em uma noite de tempestade e ao som de trovões é neste ato final do filme que vislumbramos o Will Munny de quem até aquele momento só ouvíamos as histórias. Surgindo como um emissário da morte ele se torna o algoz dos que atravessaram seu caminho e amedronta toda uma cidade com a veemência de suas ameaças.

A maneira como todos esses elementos são apresentados e se conectam mostram que a natureza brutal de Munny esteve adormecida mas não era inexistente por mais que ele vivesse em família e sem cometer crimes. Sem final feliz com o cowboy cavalgando em direção ao pôr do sol, “Os Imperdoáveis” desmistifica toda a glória dos heróis do velho oeste ao humanizar os personagens. Neste filme a morte não é rápida e indolor: é lenta, dolorosa e totalmente desprovida de honra ou glória como nos filmes que consolidaram o gênero décadas antes.


     Completando 30 anos em 2022, o filme entrou para a história do cinema não apenas pelo seu teor analítico das obras Faroeste mas também por nos apresentar a história de um homem que assim como todos nós cometeu erros no passado e não se perdoa por esses erros pois mesmo diante de tanto sofrimento que causou recebeu uma segunda chance quando foi agraciado e redimido por um  amor do qual não se achava merecedor. Uma curiosidade que torna o filme mais marcante é que Eastwood tinha o roteiro guardado por anos e esperou ter a idade certa para dar vida a Will Munny e também ganhou experiência como realizador até que o momento chegasse. Saber o momento certo de realizar “Os Imperdoáveis” mostra que o diretor empregou em seu filme todo seu talento adquirido ao longo dos anos que se dedicou ao cinema.

Sendo uma bela reflexão sobre envelhecimento, arrependimento e como nos colocamos perante as pessoas levando em conta nossos atos pretéritos a maior questão que o filme de Eastwood nos deixa é se com o tempo é possível que as pessoas mudem ou se apenas deixam de lado velhos hábitos em busca de aceitação ou da esperança de felicidade. Como dito no começo do texto, existem aqueles que convivem bem com o passado e existem aqueles que o veem como “imperdoável”, cabe a cada um de nós decidir em qual desses grupos se enquadrar.



sexta-feira, 23 de julho de 2021

E se...?

Muitas vezes nos deparamos com esse questionamento e pensamos sobre como seriam nossas vidas se em determinadas bifurcações e encruzilhadas de nossas jornadas tivéssemos tomado um rumo diferente. A grande dúvida oriunda dessa questão consiste em nunca termos a oportunidade de obter uma resposta satisfatória pois não saberemos se a decisão tomada foi mesmo a melhor possível e, sendo assim, só nos resta aprender a conviver com as consequências de nossas escolhas. Mesmo que a questão título deste artigo seja inerente a todos nós individualmente, no decorrer dos anos ela surge em âmbito coletivo com dúvidas acerca de acontecimentos históricos. Como a arte é um reflexo da sociedade em que está inserida, esporadicamente alguns cineastas, valendo-se do poder das imagens e dos recursos narrativos proporcionados pela sétima arte para concretizar suas visões, nos apresentam histórias cujo mote tem por objetivo nos apresentar uma alternativa à celebres fatos históricos.

Diferente dos filmes baseados em fatos que se apoiam em acontecimentos notórios e por vezes tomam liberdades artísticas para uma melhor apresentação do resultado final, os diretores Quentin Tarantino e Dany Boyle apresentaram 3 filmes cujas premissas partem de um “e se?” para contar suas histórias e nos conduzem por tramas capazes de nos apresentar a uma espécie de “universo paralelo” em que é capaz vislumbrar o final antecipado da II Guerra Mundial, a atriz Sharon Tate não sendo assassinada pelos membros da Família Manson e um mundo sem a existência dos Beatles.

Lançado em 2009, escrito e dirigido por Quentin Tarantino, o filme “Bastardos Inglórios” é ambientado na França ocupada por nazistas em 1944 durante a II Guerra Mundial. Nesse cenário entram em cena os “Bastardos” do título, um grupo de soldados de elite composto por judeus americanos que utiliza-se de técnicas de guerrilha para impor terror psicológico aos soldados alemães. Com a oportunidade de acabar com todo o alto comando do Terceiro Reich durante a estréia de um filme sobre as proezas de um jovem soldado alemão os Bastardos irão contar com a ajuda inesperada de um Coronel traidor da SS para exterminar Adolf Hitler e seus auxiliares mais próximos.


Já em 2019 Tarantino lançou o filme “Era uma Vez em...Hollywood” em que acompanhamos  as rotinas do ator decadente Rick Dalton (Leonardo Di Caprio), seu dublê e melhor amigo Cliff Booth (Brad Pitt) e da estrela em ascensão Sharon Tate (Margot Robie). Durante 3 dias do ano de 1969 esses personagens tão ligados ao cinema mostram ao espectador toda a aura hollywoodana da época. Se em 9 de agosto daquele ano o destino de Tate e de todos que estavam em sua casa foi trágico quando foram assassinados por 3 membros da seita liderada por Charles Manson, o filme Tarantino reserva à atriz um futuro tranquilo quando os assassinos entram na casa ao lado e encontram Cliff junto de sua pitbull Brandy e Rick dispostos a impedir que os seguidores de Manson obtenham êxito em sua maligna empreitada. Como a vingança é um tema recorrente na filmografia de Tarantino e a violência uma de suas características mais marcantes é através deste elemento que esses dois filmes geram suas catarses e nos fazem, mesmo que naqueles minutos, sentir a satisfação de saber que naquele universo as vítimas do nazismo e de Manson estão a salvo.


Também de 2019, com roteiro de Richard Curtis e direção de Danny Boyle, o filme “Yesterday” conta a história de Jack Malick (Himesh Patel) um cantor e compositor que auxiliado pela amiga e empresária Ellie ( Lilly James) tenta alcançar o estrelato. Depois que o mundo todo sofre um apagão misterioso por 12 segundos, Jack é atropelado e ao recuperar a consciência percebe que somente ele tem lembrança de muitas coisas de nosso mundo como Coca-Cola, cigarros e principalmente a banda Beatles. Utilizando sua memória Jack passa a “compor” as canções do quarteto de Liverpool  e alcança a fama e sucesso que tanto almejava. Engraçado nos momentos que o protagonista vai descobrindo aos poucos que somente ele sabe sobre marcas famosas que fazem parte de nosso cotidiano e tocante nos momentos musicais mais intimistas, Yesterday também levanta questionamentos morais quando Jack percebe que seu sucesso não é fruto de seu talento e  se ele é  merecedor de tudo que conseguiu utilizando as canções escritas por John Lennon e Paul McCartney. Além de ressaltar a importância da banda um dos méritos do filme de Boyle é nos fazer refletir sobre a ausência dela.

Enfim, esses são apenas alguns exemplos da arte como transformadora da história e cabe a cada um de nós aprender a conviver com nossas escolhas e também com escolhas alheias que nos afetam diretamente. Como o questionamento é importante, mesmo podendo aprender com os erros cometidos no passado e mesmo acreditando ter tomado a melhor decisão sempre iremos nos perguntar “e se?”.

Concordando ou discordando de minhas palavras, gostando ou não dos filmes aqui mencionados apenas pense: e se eu não tivesse lido este texto?

quinta-feira, 18 de junho de 2020

Cameron Crowe: Vivendo e Aprendendo


Quando descobre que está em um sonho  cuja realidade foi escolhida de acordo com suas preferências e necessidades, David Ames Jr. (Tom Cruise) percebe que seu psiquiatra McCabe (Kurt Russel) é a representação de Atticus Finch (Gregory Peck). Finch de acordo com os anseios de David é representação ideal da figura paterna: amoroso e íntegro. Logo depois quando resolve abandonar o sonho e voltar à realidade, David se vê envolto da iconografia de sua vida e lá está Atticus novamente. No meio de tantas imagens também está a lendária banda de rock The Who em um de seus momentos mais memoráveis: o longo grito do “yeah” do vocalista Roger Daltrey enquanto o guitarrista Pete Townshend salta energicamente com seu instrumento durante a performance da canção “Won’t Get Fooled Again”.



A professora universitária Elaine Miller (Frances McDormand) se orgulha da inteligência de seu filho Willian (Michael Angarano) de apenas 11 anos e debate com ele as implicações dos aspectos mais importantes do filme “O Sol é Para Todos” (To Kill a Mockingbird, 1962) e almeja que seu rebento siga a carreira de advogado assim como o protagonista da obra: Atticus Finch.  Algum tempo depois Anita (Zooey Deschanel), a irmã mais velha de William, completa 18 anos e decide sair de casa para escapar do controle de sua mãe e “viver a vida”. Ao se despedir do irmão Anita pede que ele olhe embaixo de sua cama pois o que tem ali irá libertá-lo. O que o garotinho encontra são discos de vinil de clássicos do rock’n’roll e, entre eles, está "Tommy" de 1969 da banda The Who. Enquanto admira as imagens do disco, o garoto nota que um bilhete de Anita cai no chão: “Ouça Tommy com uma vela acesa e você verá todo o seu futuro”. É neste momento que ele coloca o disco pra tocar e a faixa “Sparks” faz a perfeita transição temporal  mostrando Willian (agora com 15 anos em 1973 e interpretado por Patrick Fugit) como um aficcionado por rock e aspirante a jornalista escrevendo textos sobre o ritmo musical que tanto gosta. 



Através do contato com o crítico musical Lester Bangs (Philip Seymour Hoffman), por meio de seus trabalhos para uma revista local e uma série fortuita de acontecimentos Willian consegue a oportunidade de acompanhar a turnê da banda Stillwater para escrever uma matéria para a prestigiada revista Rolling Stone. Essa viagem fará com que ele embarque no universo que tanto gosta e irá lhe proporcionar, além do crescimento profissional precoce, uma jornada pessoal de descobertas típicas da adolescência.
O primeiro parágrafo relata os minutos finais do filme “Vanilla Sky” (Idem, 2001) enquanto o segundo e o terceiro relatam o mote do filme “Quase Famosos” (Almost Famous, 2000). O que estas duas obras cinematográficas tem em comum é o fato de terem sido dirigidas pelo cineasta Cameron Crowe e o que me chamou a atenção foram as claras manifestações de apreço do cineasta pelo filme “O Sol é Para Todos” e também pelo rock’n’roll e, neste caso específico, pela banda The Who. Mesmo que a sequência deste texto não respeite a cronologia do lançamento dos filmes, os relatos se encontram na ordem em que eu os assisti e somente ha alguns dias percebi a importância (mesmo que antes já admirasse muito seu trabalho) da obra de Crowe em minha vida. Apaixonado por rock, Crowe fez carreira como jornalista na revista Rolling Stone  e os eventos narrados em “Quase Famosos” são baseados em sua juventude quando teve a chance de acompanhar algumas das bandas que mais gostava. A relação de Crowe com o rock é tão próxima que durante o período de 1986 a 2010 ele foi casado com Nancy Wilson membro da banda Heart, além disso, até hoje sua filmografia conta com documentários e / ou personagens ligados ao rock.


Nos últimos anos, o The Who passou a ser a minha banda favorita e analisando cuidadosamente minhas memórias cheguei a conclusão que a origem desse  fascínio foi  o filme de Crowe ao me instigar pelo sugerido teor místico de Tommy e pelo poder sonoro de Sparks. Foi através da exploração dos trabalhos da banda que a imagem vista por David Ames, até então de origem desconhecida pra mim,  foi enfim decifrada. Em uma época em que o racismo é tão combatido é interessante lembrar da importância de Atticus Finch quando ele resolve defender a todo custo um homem negro injustamente acusado de assassinato pois é o que o personagem acredita que seja o certo a se fazer mostrando desta forma o poder do cinema ao comunicar temas importantes e delicados. Por mais que sejam coisas diferentes Crowe consegue em seus trabalhos levar para o público temas relevantes através de sua arte e esse é o principal ponto deste texto: mostrar como a arte reflete a sociedade e como ela pode influenciar nossa vida de maneira profunda.
Os sentimentos que as letras do The Who me trouxeram, e ainda trazem, com o passar dos anos foram determinantes para decisões e pensamentos importantes; os príncipios de Atticus são exemplares tanto no campo pessoal quanto profissional e Crowe comunica sua essência nestas obras e o fato dessa essência perdurar (para mim e pra quem consegue apreciar) é o que mais me encanta pois creio que atualmente a frivolidade tirou a voz de verdadeiros artistas em detrimento de falta de conceitos que podem agregar conhecimento, pobreza artística e influência comportamental questionável.
Alinhado com o trabalho de Crowe por me considerar um cinéfilo desde a adolescência e fã assumido de rock’n’roll devido a sua riqueza tematica e diversidade de estilos, me pergunto se somos admiradores do cinema que gostam de rock ou rockeiros que curtem cinema. A resposta não é importante pois neste caso o que realmente importa é como nos relacionamos com a arte e como deixamos ela nos influenciar e definir sempre através de  contemplação, reflexão e também, por que não, diversão.


quarta-feira, 15 de outubro de 2014

"Você mesmo disse sua besta. Somos os Guardiões da Galáxia."

     

     Você já parou pra pensar na diversidade de um grupo de amigos? Ou mais especificamente no seu grupo de amigos? Mesmo que toda "turma" funcione dentro de uma estrutura arquetípica (o mais alegre e piadista, o mais sério e introvertido, o mais irritadiço, etc.) é curioso e deveras interessante notar como pessoas aparentemente diferentes umas das outras possam formar um grupo de amigos que muitas vezes perdura por anos e como todas essas caractrísticas individuais funcionam dentro de um contexto permeado pela pluralidade. A amizade e o que leva pessoas distintas a formar um grupo unido e coeso são os temas centrais do excelente Guardiões da Galáxia (Guardians of the Galaxy, 2014) de James Gunn, aventura cósmica do Marvel Studios que expande o universo da "Casa das Idéias" nos cinemas e apresenta ao grande público um grupo de heróis quase desconhecidos em uma aventura empolgante, divertida e emocionante.
     Depois de ser abduzido da Terra ainda criança Peter Quill (Chris Pratt), ou Senhor das Estrelas como gosta de ser chamado, se torna um saqueador interplanetário e toma posse de um item misterioso denominado orbe. Depois disso se vê acossado pelos caçadores de recompensas Rocket Racoon ( voz de Bradley Cooper) um irráscivel e genial guaxinim e Groot (voz de Vin Diesel) uma árvore dotada de consciencia e com caractrísticas especiais, a assassina Gamora (Zoe Saldana) e seus colegas saqueadores. Essa situação resulta em uma confusão no planeta Xandar e Quill, Rocket, Groot e Gamora são presos, na cadeia conhecem Drax (Dave Bautista) um assassino em busca de vingança depois da morte de sua família. Da maneira mais inesperada esse grupo se une para arquitetar uma fuga e evitar que Ronan, O Acusador (Lee Pace) se apodere do orbe e o utilize para destruir o planeta Xandar e para tal contam com a ajuda dos saqueadores liderados pelo engraçado e ameaçador Youndu (Michael Rooker) que também tem interesse em possuir o orbe.
     Sem se levar a sério o filme desenvolve bem os personagens e suas interações o que gera ótimas piadas que fazem refência à cultura pop,é incrível por exemplo como o texto da uma fluidez às situações para surjam piadas sobre Kevin Bacon e o pintor Jackson Pollock. Além da inteligência do roteiro Gunn se mostra um hábil diretor ao utilizar a trilha sonora, composta por hits dos ano 70 e 80, como um interessante elemento narrativo se encaixando no contexto das cenas uma vez que um walkman é a única ligação de Peter Quill com o planeta Terra. Duas cenas bem bacanas mostram o esmero ao conciliar a música com as imagens : uma logo no começo do filme quando o Senhor das Estrelas dança alegremente ao som de "Come and Get Your Love" do Redbone e ignora os perigos a sua volta e na cena de fuga da prisão quando toca a música "Escape (The Piña Colada Song)" de Rupert Holmes.
    O grande mérito do roteiro escrito pelo diretor James Gunn e Nicole Perlman é dar ao filme o equilíbrio perfeito entre aventura, humor e drama. Sempre hilário e debochado o filme também dá aos personagens um estofo dramático que gera cenas introspectivas e tocantes e sabe fazer isso sem soar piegas mantendo o tom caricato que torna seus  personagens incríveis. Em um elenco composto por atores competentes é Chris Pratt que se destaca pois seu Peter Quill tem as caractrísticas necessárias para que tenhamos empatia pelo seu personagem ao enaltecer as virtudes de sua indole e criamos imediatamente uma grande identificação por ele, que dançando na frente do vilão ou se emocionando ao ler uma carta de sua falecida mãe nos mostra seu carisma.
      Alguém já definiu Guardiões da Galáxia como "2 horas de felicidade" e é notável a qualidade do filme por entregar exatamente isso ao público, o prazer que sentimos vendo um humano, um guaxinim, uma árvore, uma assassina verde e um cara que não entende ironia e sarcasmo se unirem em prol de uma boa causa. Guardiões é sem sombra de dúvida o melhor filme da Marvel até agora pois se difere ao dar a seus personagens características humanas principalmente ao descobrirem aos trancos e barrancos um dos mais belos sentimentos existentes: a amizade verdadeira.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

O Lado Bom da Vida


     Depois de descobrir a infidelidade da esposa, Pat Solitano Jr. (Bradley Cooper) é acometido por um surto de violência que resulta na sua internação em um hospital psiquiátrico. Após 8 meses, ele é considerado apto a deixar o hospital e ao sair tem que lidar com as mudanças ocorridas durante sua permanência no sanatório. A mudança mais drástica consiste no fato do protagonista ter que voltar a  morar com os pais depois que a esposa lhe impõe uma medida restritiva que o proíbe de chegar a menos de 850 metros dela.
     O "choque de estranheza" de Pat só é amenizado depois que ele reencontra o amigo Ronnie (John Ortiz), que o convida para um jantar em sua casa. É nessa ocasião que Pat conhece Tiffany (Jennifer Lawrence) ,cunhada de seu amigo, que também passa por um momento complicado na vida pois perdeu o marido em um acidente (do qual se considera culpada) e o emprego devido a  sua conduta imprópria. De maneira inicialmente reticente e truncada surge uma amizade entre os dois. Essa relação irá proporcionar a ambos a chance de redescobrirem as coisas boas da vida, inclusive o amor.
   Baseado no livro de Matthew Quick,  O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook) escrito e dirigido por David O. Russel, equilibra drama e comédia mostrando uma trama apoiada nas ótimas interações dos personagens, que são representados por um excelente elenco que conta  com nomes como Robert De Niro como o pai de Pat, uma fanático por futebol e apostas e Chris Tucker como o hilário Danny, personagem que Solitano conhece no hospital psiquiátrico.
     O destaque fica por conta de Bradley Cooper, que se mostra versátil ao dar vida a um personagem atormentado e a talentosa  Jennifer Lawrence , que depois de Inverno da Alma, X-Men - Primeira Classe e Jogos Vorazes entrega mais uma soberba atuação dando um enorme carisma a Tiffany. Juntos eles mostram possuir uma boa química - seja em diálogos ou cenas de dança - dando ao romance latente dos personagens um inusitado toque de estranhamento e fascinação.  
     O Lado Bom da Vida diverte e emociona em uma bela história que mostra a importância de estarmos abertos a novas experiências na vida pois mesmo que o passado e o sofrimento ajudem a nos definir não devem se tornar  lastros em nossa jornada rumo a uma vida melhor.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

A melhor ideia ruim que temos.

   
     Em 1997, o presidente norte-americano Bill Clinton tornou públicos os arquivos de uma ousada , e extremamente perigosa, operação de resgate realizada pela CIA no Irã em 1980.  Depois de ser deposto pelo regime xiita do aiatolá Khomeine, o Xá Reza Pahlevi obteve exílio em solo americano fato este que fomentou a ira dos revolucionários e culminou na invasão da embaixada americana em Teerã em 1979. Durante a invasão cinquenta e quatro funcionários foram feitos reféns entretanto seis conseguiram fugir e pedir abrigo na embaixada do Canadá. No intuito de salvaguardar seus cidadãos e evitar incluir o Canadá
em uma grave crise diplomática a CIA resolveu apostar na ideia ( que passados os anos é vista como brilhante, mas que na época parecia loucura) do agente Tony Mendez. 
     O que Mendez planejava era utilizar a produção de um filme falso como pretexto para fornecer disfarces aos compatriotas e assim retirá-los do Irã. Com base nos registros da missão e no livro escrito pelo próprio agente responsável pela missão (em conjunto com Matt Baglio) o ator, e agora  diretor, Ben Affleck concebeu o excelente filme Argo, que em breve estará disponível em DVD e Blu-Ray.
     Para dar credibilidade à sua farsa Mendez (Ben Affleck)  contou com a ajuda de dois especialistas da indústria cinematográfica hollywoodiana: o maquiador John Chambers ( John Goodman) e o produtor Lester Siegel (Alan Arkin). O primeiro passo foi montar um escritório de uma falsa produtora e logo após comprar um roteiro que justificasse filmagens em locais exóticos e o escolhido foi o script da ficção-científica Argo. Após a aquisição do roteiro era necessário uma massiva cobertura da imprensa especializada, o que culminou em uma leitura pública de texto feita por um elenco de profissionais, poster e fantasias dos personagens. 
     Com um roteiro inteligente e equilibrado, escrito por Chris Terrio e Joshuah Bearman, o filme utiliza metalinguagem para prestar um tributo ao cinema discorrendo sobre o poder da sétima arte (tendo na cena da exibição dos storyboards para a patrulha do aeroporto o melhor exemplo disso) além de proporcionar ao espectador momentos de extrema tensão sobretudo em todo o arco da execução do resgate. Outro mérito do texto consiste na explicação da formação do povo iraniano e dos eventos que movem a trama. Essa sequência logo no inicio do filme fornece ao público o estofo histórico para acompanhar toda a história e entender, mesmo que superficialmente, a origem do ódio que os iranianos nutrem pelos americanos.
     Foi uma surpresa para todos quando Ben Affleck, ator outrora criticado, se mostrou um bom diretor sendo inclusive cotado para dirigir o vindouro filme da Liga da Justiça. Argo chega ao Oscar desse ano como um dos favoritos ( sobretudo depois da premiação de melhor filme no Globo de Ouro)  e mostra o melhor momento da carreira de Affleck até aqui pois  como  ator ele entrega uma ótima e contida atuação exatamante da maneira que o discreto personagem exige. Como diretor ele demonstra um domínio notável dos elementos cinematográficos para compor um bom filme e se prova talentoso contando uma inusitada história que, por mais farsesca que pareça, cativa a todos por ser real.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

They're all wasted!


     Em 1968, o cineasta George Romero revolucionou drasticamante as histórias de zumbis ao conceber o filme "A Noite dos Mortos-Vivos". Por conter elementos que na época eram inovadores às histórias dos mortos-vivos e inserir ao longo de sua narrativa uma forte crítica social o filme se tornou uma influência básica para as histórias de zumbis com o passar dos anos. Um dos muitos influenciados pela obra de Romero foi Robert Kirkman que no ano de 2003 lançou a revista em quadrinhos entitulada The Walking Dead. Sem muito sucesso nos seus anos iniciais foi somente em 2006 que a criação de Kirkman se consolidou no mercado quando a edição 33 se esgotou em apenas 24 horas. O sucesso das hq's gerou interesse do canal  AMC que ( juntamente com Frank Darabont exímio roteirista e diretor) desenvolveu o projeto televisivo de The Walking Dead. 
     No ar desde 2010 e atualmente em sua terceira temporada a série acompanha a história de Rick Grimes (Andrew Lincoln), um policial que entra em coma depois de ser baleado e ao retomar a consciência meses depois encontra um mundo devastado e povoado por zumbis. Depois de reencontrar a família, o protagonista passa a integrar um grupo de sobreviventes do qual se torna parte essencial ao assumir uma função de liderança. Com o intuito de garantir subsistência e segurança o grupo de Rick se desloca, adiciona  novos membros à sua composição mas também sofre baixas em decorrência dos diversos confrontos com mortos-vivos. 
     A pluralidade de personagens da série é representada por um eficiente elenco, composto em sua maioria de atores pouco conhecidos em que se destacam Norman Reedus como Daryl, braço direito de Rick; Jon Bernthal como Shane, cuja rivalidade com o protagonista tem um fim trágico; Sarah Wayne Callies e Chandler Riggs, como Laurie e Carl respectivamente, personagens que compõem o núcleo familiar de Rick; Steven Yeun como Glenn, um jovem especializado em infiltrações rápidas em territórios desconhecidos e responsável pela aquisição de vários recursos para o grupo; Jeffrey DeMunn como Dale o mais velho do grupo e que muitas vezes faz o papel de pai e conselheiro e Scott Wilson como Hershel um fazendeiro que acredita que o mal que assola os infectados é uma doença passível de cura. Mas é Andrew Lincoln que se saí melhor dando vida a um personagem  que sente o peso da liderança e das escolhas difíceis que deve fazer para manter todos seguros.
         Com uma ótima produção técnica o programa consegue transmitir todo o caos do "novo mundo" e isso fica perceptível nos cenários e na maquiagem dos atores. O único ponto fraco da série em quesitos técnicos é a computação gráfica utilizada para mostrar alguns zumbis e jatos de sangue que por vezes soam deveras falsos mas isso é justificável pelo orçamento menor que as produções televisivas recebem. As cenas de ação além de fluentes com a história  mostram as mais inusitadas maneiras de se destruir zumbis. Seja em espaços abertos ou corredores estreitos os personagens mostram que vale tudo pela sobrevivência e utilizam as mais inusitadas e surpreendentes armas em nome da autopreservação.


      Os roteiros da série são primorosos pois a equipe de escritores consegue dar o tom dramático necessário para que os personagens sintam, cada um a seu modo, a sua desolação diante de um mundo arruinado. As histórias também criam muita tensão pois cada novo lugar pode esconder uma surpresa, o que  muitas vezes culmina em sustos ao espectador. 
      A série utiliza de maneira inteligente seu subtexto para dar ao espectador um vasto material de reflexão política e social. Isso pode ser exemplificado em dois momentos: quando Rick não aceita as críticas e questionamentos de seus colegas e toma para si  responsabilidade pelo grupo e brada a frase: "Isso não é mais uma democracia." e quando somos apresentados a um simpático e carismático líder de uma comunidade livre de zumbis, que revela-se um homem com atitudes e intenções nefastas que é chamado de Governador.
          The Walking Dead entretém o público com drama, ação e suspense e mostra um mundo cruel em que os mortos voltam a vida e representam um grande perigo mas, em muitas ocasiões,  os vivos é que devem ser temidos.